31 agosto 2015

Logo no primeiro almoço do ano novo, senhores...

Ela contava-me das suas férias, num desses sítios tenebrosos onde as pessoas estão sempre desassossegadas porque há quem lhes interrompa a leitura para lhe propor actividades bizarras, esses locais onde as pessoas estão sempre a comer porque está tudo incluído, contava-me ela das noites de vestir de branco, do gin com cores que não são de gin, das manhãs na piscina (e a praia ali ao pé, senhores...), das pessoas muito interessantes que por ali andavam na mesma modorra, das crianças entregues ao pessoal das actividades, de como os dias se passaram no percurso sala de jantar-piscina-actividades bizarras na sala de jantar ou na piscina, sem conhecer nada fora daqueles muros, fora dos muros não se aplicava o regime de tudo incluído.

Mantive a compostura e disse-lhe que sim, que as minhas também tinham sido boas.

30 agosto 2015

Decisões de ano novo

Ir mais vezes a Alvalade com o meu pai. Ler o "Ensaio sobre a cegueira". Não fazer batota nos alongamentos. Chegar mais cedo a casa. Ouvir os discos de vinil que herdei do meu tio de França. Seguir uma série. Prever na agenda tempo para não fazer nada. Conhecer um país novo. Procrastinar menos. Decidir em quem vou votar. Passar a explicar às pessoas o motivo porque as tirei da minha vida. Voltar a mergulhar. Ter mais paciência com pessoas tontas. Jogar mais xadrez.

O drama. O horror.

29 agosto 2015

Fim do ano

Mar bravo. Cerveja fria. Amigos que aparecem para jantar porque só estavam a cento e cinquenta quilómetros dali. Lançar papagaios antes de haver alguém na praia. Telemóvel em modo de voo durante três semanas. Terminar livros deixados a meio no último ano. Comprar jornais desportivos todos os dias menos no dia a seguir àquilo dos russos. Entrar de férias no primeiro dia de férias, nem mais um segundo. Cumprir o velho sonho de fazer parte do El Camiño. Dormir em camaratas. Andar trinta quilómetros por dia, a pé. Queijo manchego e vinho Ribeiro. Santiago de Compostela e a praia de Muxia. Não saber notícias de espécie alguma durante duas semanas.

Pode entrar o ano novo.

25 agosto 2015

23 agosto 2015

Quer-me parecer...

que os meus amigos benfiquistas vão custar-me um dinheirão em mensagens de consolo este ano.

Voltei a ler blogs

Os bons continuam bons, com uma excepção. Um mundo com bons blogs, bem escritos, com ideias originais, é um mundo melhor.

Os maus estão cada vez piores e temos que saber lidar com esta realidade nefasta, que a todos nos envergonha. Temos que ser solidários, dar as mãos, ajudar aquelas pessoas. Escrevem blogs como nós, são só pessoas que estão a ter más vidas, pessoas que não estão a lidar bem com o ocaso de antigos esplendores. Cabe-nos a nós, bloggers esclarecidos e a quem a vida tem sorrido, ajudar aqueles que mais precisam, dar-lhes uma boa palavra, ser gentis, integrá-los, dizer-lhes que está tudo bem, que as coisas serão mais resplandecentes.

(Nisto dos blogs, nada de novo)

21 agosto 2015

Uma coisa nova por dia

Às sete da manhã ter as ruas de Santiago por minha conta para  correr, fazer alongamentos no Obradoiro enquanto chegam os primeiros peregrinos, entrar na Catedral e ter verdadeiramente tempo de reflexão porque só lá estou eu.

20 agosto 2015

Santiago de Compostela

Santiago de Compostela foi a primeira cidade fora do meu país que visitei por minha conta. Cantámos Zeca nas escadas da catedral, já era madrugada, foi em Santiago que aprendi que Espanha não era una e indivisível, foi em Santiago que começou esta paixão pelas viagens com tempo, tempo para conhecer as manhas da cidade, para entender a história, para fazer parte da cidade, para conhecer os recantos que realmente importam.

Voltei uma meia dúzia de vezes, fosse para visitar amigos, pela Universidade ou só porque sim.

Desta vez Santiago deixou-me um amargo de boca, uma coisa chamada Cidade da Cultura, onde fui ver uma exposição alusiva às origens do Caminho. É um hino à megalomania, ao desperdício, a pedir meças aos estádios do Algarve e de Aveiro, mas em pior e em mais obsceno.

(É bem bonito, o edifício.)

19 agosto 2015

O fim do Caminho

Penúltimo post do Caminho

Coisas do Caminho

Se eu pudesse resumir a minha experiência do Caminho numa ideia, diria que o que mais me impressionou foi a energia, como que se a boa experiência dos muitos que fizeram o Caminho antes de mim pairasse no ar e me convidasse a confiar, a crer que no fim tudo estaria bem, nada de "coisa transcendental", apenas aquilo que os mais novos chamariam "boa onda". Tive uma sensação completamente oposta quando estive em Dachau, um sítio onde senti o mal e onde estive sempre em alerta e em silêncio.

Não regresso melhor pessoa nem tive uma experiência mítica, nem sequer tomei decisões para a vida. Mas aprendi que ainda sou capaz, que no Caminho nunca estamos sozinhos (olá Kurt, espero que a televisão da Noruega passe o teu documentário sobre o Camiño, olá Zé, no seu sétimo Caminho, sempre diferente, e que aprendeu da pior forma que as botas Timberland são tão impermeáveis que não deixam respirar os pés, olá Dirceu, brasileiro de Florianópolis, instrutor de surf no Brasil e estudante de cozinha em Santiago que me ensinou como se fazem seiscentos quilómetros de Caminho com setenta euros, olá casal de reformados da Bahia que me fizeram pensar "é isto que quero para a minha reforma",  olá miúda italiana que foi a última a sair do albergue de Portomarin e que nunca saberá que apostei que nunca completaria o primeiro quilómetro, tão feridos ela tinha os pés, e que me cumprimentou com um sorriso largo enquanto eu bebia uma cerveja e só lhe voltei a desejar Buen Camino quase no fim da  jornada) e que sou bem capaz de vir a fazer isto de novo.

17 agosto 2015

Coisas do Caminho

Impermeável, tampões para os ouvidos, telemóvel, mochila com mais de vinte anos, casaco quente, calças de montanha, óculos para ler, escova e pasta de dentes, calções, duas t-shirt, um bloco Moleskine pequeno, caneta Montblanc, cantil, chapéu, livro, botas, chinelos, dois pares de meias, cartão de crédito, documentos, estojo de primeiros socorros, duas mudas de roupa interior, saco-cama, toalha, canivete suíço, barras de cereais, molas de roupa, creme para os pés.

É tudo o precisamos para nove dias.

Coisas do Caminho

Era uma passagem estreita, rodeada por carvalhos, algures pelo quilómetro trinta. Chovia, daquela chuva miudinha. Comecei por ouvir um som de saxofone, primeiro muito ao longe, depois cada vez mais nítido. Era um peregrino que tocava, atrás dos carvalhos, invisível, para que nos chegasse apenas a sua música. Às vezes não é preciso muito para nos desmoronarmos.

Não chorava há mais de doze anos.

Coisas do Camiño

Não quis saber muito sobre o Camiño mas os que por aqui passaram antes de mim deixaram spoilers suficientes. Que o Camiño me faria diferente. Que o importante era a caminhada e não a chegada. Que O Senhor me ajudaria se eu desfalecesse. Que o esforço é sempre recompensado. Que a dureza do Camiño seria atenuada pela bondade do meu coração.

Felizmente,  Sam, the red, deixou uma mensagem escrita na parede do bar onde tomei a primeira refeição: "prefiro andar todo nu, besuntado de mel no meio de uma família de ursos, do que fazer o Camiño outra vez".

Não há nada como ter alguém a dizer as coisas tal e qual elas são.

16 agosto 2015

Coisas do Camiño

A rapariga italiana levantou-se da mesa e entrou no táxi que acabava de chegar. Vinte pares de olhos fixados na rapariga, ninguém chama um táxi para fazer os últimos três quilómetros de uma tirada de quase trinta. Silêncio total no bar, a rapariga italiana com os olhos no chão, derrotada. Olhei-lhe para os pés descalços,  num relance. Eu também teria chamado um táxi. Dez quilómetros atrás.

07 agosto 2015

A caminho de El Camiño

Não faço ideia do que vou à procura em El Camiño. Não vou pelos níveis de religiosidade, não vou para fugir de nada, não vou pela beleza do percurso, não vou para provar que sou capaz de andar muitos quilómetros por dia e não vou pelo revivalismo de andar com uma mochila às costas e dormir em albergues onde terei que esperar a minha vez para tomar banho. Talvez vá pelo entusiasmo que me transmitiu quem já foi, por saber que um bom Ribeiro acompanha muito bem pulpo a la Gallega, pelo Paris-Dakar, pelas recordações de Santiago, onde já fui feliz, tremendamente feliz.

Talvez vá à procura de tempo para pensar. O meu ano novo começa sempre em Setembro.

06 agosto 2015

Dois posts ao mesmo tempo. Dois bons posts, admito.

Acordei com insónia, uma espécie de treino para me levantar às cinco da manhã quando estiver a percorrer El Camiño, e recuperei um Saint-Exupery a que recorro muitas vezes, "Terre des Hommes", gosto de reler como Henri Guillaumet, um bravo da Aeropostale, despenha o seu Potez 25, usavam-se naquele tempo os motores Lorraine de 12 cilindros, e Guillaumet, em pleno inverno austral, durante cinco dias e quatro noites, casaco de cabedal de piloto de aviões daquele tempo, percorre os Andes, gelo e neve, sem uma corda dinâmica ou um mosquetão ou um arnês que lhe atenue o esforço, acaba por salvar-se, havia de ser Saint-Exupery, o próprio, a ir buscá-lo à aldeia andina onde, ao fim de quatro noites e cinco dias, Guillaumet conseguiu chegar, não porque fosse experiente na escalada, não porque tivesse uma mentalidade que o fizesse aguentar o esforço extremo, mas porque, durante a caminhada pensava numa mulher, na sua mulher, à sua espera, crendo no impossível, não deixando de acreditar que ele, Guillaumet, havia de chegar, cinco dias e quatro noites, um blusão de cabedal, o inverno nos Andes, não sei se já tinha referido isto.

Saberes empíricos

Entra, Ruben Patrick, certamente terás boa razão para, sem te fazeres anunciar, me interromperes este meu cofiar de barba de três dias enquanto decido se o Nikka from the Barrel substitui com vantagem o Tullamore Dew, sim é a Turandot, Puccini, é a história de uma princesa que odeia homens, não creio que seja do teu agrado, mas diz-me, que urgência é essa?, se bem entendo desejas saber o meu segredo para que a tua primita, sete anos cheios de galhardia, que não liga a nenhum adulto, que foge a sete pés de quantos a querem beijocar e pagar ao colo, que lhes foge e deixa as tias inconsoláveis por não lhe conseguirem arrancar um beijinho, porque razão a rapariguita parece apreciar a minha companhia e me pede que lhe conte das minhas histórias?

Ora Ruben Patrick, é uma velha técnica que a vida me ensinou, em se tratando de mulheres, seja qual for a idade delas, quanto mais fizermos de conta que não as notamos, que não pretendemos os seus favores, que não desejamos a sua atenção, mais elas se inquietam, se aproximam, imploram um segundo que seja do nosso tempo. 

As únicas vitórias até agora


(e que assim seja até segunda-feira...)

04 agosto 2015

Ajude o pobre Pipoco a tomar uma decisão

A ideia de ter ver morrer os posts umas horas depois de nascerem agrada-me por várias razões. Por um lado, gosto da ideia do efémero, de nada aqui ser tão importante que mereça ficar escrito na pedra. Por outro lado, revendo o que está escrito, não me orgulho de tudo. Finalmente, diverte-me esta fórmula.

Francamente, não previ que quem lê sentisse tanto a mudança e manifestasse o seu desagrado nos comentários e, principalmente, fazendo-me saber por mail a má pessoa que sou por lhes ter destruído os comentários que tão carinhosamente teceram num determinado post. Há uma parte deste blog, a maior parte, que é minha mas há uma parte do blog que é de todos, dos que comentam, dos que me habituaram à sua presença, dos que me convidam a ver as coisas de outra forma. Quisesse eu que este blog fosse só meu (e não quero) e tornava-o privado. Não é o caso, gosto muito mais de ter a companhia de todos, até os anónimos mauzões têm um cantinho no meu pequeno coração.

Dito isto, qual será a fórmula ideal? Recuperar os posts mais do meu agrado e republicá-los? Deixar publicado o que escrevo a partir de agora? Republicar tudo? Republicar o que me pediram (é incrível a quantidade de posts de que as pessoas se lembram e me pediram para enviar, é quase enternecedor).

Ah, a doce incerteza do caminho a seguir...


Em verdade te digo, Ruben Patrick

O sentido de humor, Ruben Patrick, é muito diferente de seres o palhaço do grupo. O sentido de humor é a maneira única como vês aquilo que todos vêem da maneira de sempre, é a desconstrução, é não teres medo de pegar nas tuas fraquezas e fazer de conta que as superaste (mas não, Ruben Patrick, continuam a ser as tuas fraquezas, só que vistas de outro prisma...), é seres capaz de notar o pormenor e ser esse pormenor, aquele que todos poderiam notar (mas não, foste tu quem notou), essencial para perceber que as coisas, todas as coisas, têm sempre uma segunda leitura, tal e qual as pessoas.

É uma arte difícil. Mas elas valorizam tanto...

03 agosto 2015

Começo a acreditar

..que é impossível encontrar "A Defesa Lujin", de Nabokov.

Silly season

Às vezes, sempre que posso, quase nunca, leio desses blogs escritos para me animar. Nessas alturas demoro-me a pensar o que levará a blogger a concluir bizarrias deste quilate, perco o teu tempo a imaginar que infância danosa justificará os desacertos presentes, demoro-me a perceber como, partindo de uma ideia conceptualmente correcta, a de os Homens serem todos iguais, afinal a essência do socialismo e um dano colateral da nossa formação judaico-cristã, pode ser prejudicada por uma espiral de insanidade que conduz a blogger a um desvario que lhe prejudica a assertividade.

Imagino que o marido da blogger (elas gostam de se lhes referir como "maridão" ou Mister qualquer coisa, mas são coisas só lá da imaginação delas, de facto trata-se apenas do marido) terá feito uma travagem brusca, provavelmente com a blogger a dormitar, acontece muito isso das travagens bruscas quando elas dormitam. E isto, provavelmente resultado de uma mulher a conduzir um Fiat 500 que se lhe atravessou à frente, obrigando-o a ele, com os seus reflexos potentes e nervos de aço, a convocar todas as suas reservas de adrenalina para que a vida da blogger fosse salva, talvez mesmo a das quinze criancinhas que, cantando o "Indo eu a caminho de Viseu" atravessavam numa passadeira nesse preciso momento, após toda esta demonstração de sangue-frio e altruísmo, tem como paga ser rotulado de imaturo, carregando sobre as suas costas ter contribuído para que todo o género masculino passasse à mesma condição de imaturidade.

E é ela, a blogger que tira retratos a si própria dentro de um armário e que escolhe maus óculos como se não houvesse amanhã, que nos diz que somos todos uns imaturos. E isto, parecendo que não, diz muito sobre a situação.

(activação de marca é isto que eu vos estou a fazer, meus caros...)

Há uma boa notícia lá naquilo dos agenciamentos de blogs, corrigiram parte dos erros ortográficos. Mantém-se os erros de sintaxe e uma bizarra noção de colocação de vírgulas (eu posso...), mas não se pode mudar tudo num dia, há que dar tempo ao tempo, aquela rapaziada está a começar e não se lhes pode pedir que escrevam em condições, as marcas que querem ser activadas nem notam esses pequenos nadas, ansiosas que estão a aguardar que os "bloggers mais influentes do país" iniciem o processo de "influenciar decisões , criar influências e provocar atitudes".

Agora a sério, isto do empreendedorismo está a chegar aos limites da insanidade, não está?

02 agosto 2015

Quando Pipoco propõe um vídeo é porque é mesmo um bom vídeo

Esta coisa do tipo de Cesena e dos Foo Fighters faz-me confirmar o que sei há muito, que as pessoas são boas. Mil músicos italianos, de todas as idades, a tocar à borla por um projecto. Vinte milhões de visualizações quando estiverem a ler isto, eram dezasseis quando o escrevi. Eu achei bonito. Os Foo Fighters também, já avisaram que sim, que vão a Cesena.


Que estás a fazer neste momento, Pipoco?

01 agosto 2015

As coisas são como são

Podíamos ser uma sucessão de acasos, de improbabilidades estatísticas, se Plutão alinhar com Capricórnio quando a terceira lua de Saturno estiver no zénite de Leão, podíamos ter ouvido o Barco Negro de Amália, a mais bonita das canções de amor, num walkman, estendidos nas areias de Patmos, podíamos ter combinado encontros em Atenas, tu chegada de Lisboa, eu de Salzburgo e chegarmos à mesma hora, podíamos ter mergulhado juntos numa gruta submarina em Porto Santo e num barco afundado em Cabo Verde, podíamos ter-nos perdido nos Picos e ainda assim estar tudo bem, podíamos ter apostado tudo numa ideia, uma vez, outra vez, mais uma vez e ter resultado sempre, podíamos entender-nos só com um olhar, um franzir de sobrolho significaria que estava na hora de saírmos desses jantares onde terias que me acompanhar e estaria na hora de descalçar os sapatos, um gesto de mão significaria que o meu estado de alma pedia poucas palavras, podíamos ter histórias de filmes que nunca viste porque adormeceste antes do genérico, eu a afagar-te o cabelo, poderia ter-te dito que é um rapaz, a minha posição privilegiada permitiria dar a notícia em primeira mão, poderíamos ter subido a montanhas, nadado em lagos alpinos, dormido ao relento, adoptado cães e gatos e coelhos, eu fazendo de conta que não há nada mais confortável que fatos italianos e gravatas francesas, tu sabendo que nada me regala mais que uma t-shirt e umas botas de montanha, podias ter acreditado em mim mais do que eu próprio (e como isso é quase impossível...).

Podíamos ter tido tudo isto. E tivemos.