... eu não saiba arrumar à primeira nos lugares do lado esquerdo, talvez não consiga ler letras muito pequenas, talvez já não aguente duas noites seguidas sem dormir, talvez já não seja paciente com todos a toda a hora, talvez já não conceda segundas oportunidades para uma primeira boa impressão, talvez desligue mais rapidamente quando a conversa não tem sentido, talvez já não goste tanto de Sepúlveda, talvez já não comece a leitura do Expresso pelo caderno de Economia, talvez tenha mais cuidado com o que como ao jantar, talvez já não acredite que conseguirei terminar Ulysses.
Mas, em verdade te digo, continuo a cozinhar o melhor arroz de corvina que podes imaginar.
30 outubro 2017
29 outubro 2017
Fechando o assunto com a minha grande chave de oiro reluzente cravejada de diamantes
A sociedade civil mobiliza-se e oferece roupa e cobertores, os da Agricultura levam ração e fardos de palha a quem arderam os pastos, os bombeiros foram enormes, as populações lutaram até à exaustão, as pessoas de muito longe manifestam-se, o Presidente diz que estará atento, o Primeiro-Ministro anuncia dinheiro para todos.
Estamos todos de parabéns, menos nós.
Estamos todos de parabéns, menos nós.
26 outubro 2017
Enquanto te manifestavas (4 - e último)
Amanhã à noite vou lá outra vez.
(e essas novas manifestações, já estão convocadas ou quê?)
(e essas novas manifestações, já estão convocadas ou quê?)
25 outubro 2017
Enquanto te manifestavas (3)
Em chegando ao sítio, procura pelo Café Central e saúda quem lá estiver. Pergunta se sabem de alguém que precise de alguma ajuda e logo te dirão quem mais precisa e onde te deves dirigir, ninguém te dirá que ele próprio precisa do que quer que seja. Escuta as histórias que te vão contar, sem interromper. Notarás que ninguém se referirá ao que lhe aconteceu a si próprio, mas ao que aconteceu ao colectivo. Ouve de novo, ainda que seja a mesma história. Ouve outra vez. Resiste a dizer que agora é levar isto para a frente, que o que lá vai lá vai. Agradece e aperta a mão a quem lá estiver. Aperta mesmo a mão, ainda que te estendam só o pulso, envergonhados das mãos de trabalho duro. Convida alguém a acompanhar-te a onde vive quem precisa. Ouve de novo a história que te vão contar e interessa-te pelos pormenores, como foi que um salvou a casa atacando os pequenos focos com uma enxada, um por um, como foi que outro tirou a velha senhora que não se conseguia deslocar, como foi que um outro viu a casa do avô arder e ele a salvar o quartel dos bombeiros, o vale em chamas pelo meio. Se apenas ouvires, já fizeste bastante. Nota que te dirão que não é precisa mais comida nem mais roupa nem mais cobertores. Não penses que as pessoas são mal-agradecidas, as coisas são como são. Compra roupa interior, boinas, meias. Compra novo. Não culpes o governo, este ou outro qualquer, nem a protecção civil nem os bombeiros. Os que lá estão não culpam ninguém e eles sabem melhor do que tu destas coisas. Janta num restaurante local, mete o boletim do euromilhões na tabacaria da terra, compra o que tiveres que comprar nas lojas locais. Deixa café pago para os vinte que vierem a seguir, a dona do café que decida quem menos pode pagar aqueles cinquenta cêntimos. Volta pelo menos uma vez por mês, um ano seguido. De cada vez que lá fores, apanha pinhas e lenha em vez de comprar os briquetes (é assim que se escreve, não é?) na loja. Leva os teus filhos, os teus amigos, a tua família, e planta carvalhos e azinheiras e castanheiros. Planta onde te apetecer, na maioria dos sítios ninguém se vai importar. Exige saber para onde foi o teu dinheiro, o das contas solidárias e o dos impostos. Lembra-te que os milhões que o governo anunciou e que tanto te apaziguaram não são de mais ninguém senão teus, ainda que pareça que é dinheiro do estado ou de Bruxelas, não te esqueças que o estado e Bruxelas não têm dinheiro se tu não lho deres. Escreve aos deputados, ao Presidente da República, diz que sabes que o dinheiro é teu e tens o direito de saber para onde irá cada euro. Cada cêntimo.
E sim, manifesta-te se achas que é coisa de valor.
E sim, manifesta-te se achas que é coisa de valor.
Enquanto te manifestavas (2)
Não fosse o carvalho grande ter ardido, era o carvalho a que eu subia no fim do Verão para ler os livros da Enid Blyton, e talvez eu tivesse ficado, havia de ponderar dar um salto à manifestação, ou se calhar não, afinal eu não tenho isso do facebook e ninguém havia de me convocar, se fosse havia de me exasperar a debater quantos lá estávamos, havia de suspirar e pensar "como é possível?" enquanto passavam as imagens do telejornal, é certo que talvez me aliviasse digitar uns valores em euros, ou então havia de seleccionar boa roupa, nada dessas limpezas de armário que nos livra de camisas fora de moda ou de casacos com um buraco pequenino, desses que quase não damos por eles, afinal um casaco com um buraco pequenino é melhor que casaco nenhum, é ou não é?
Mas deu-se o caso de ter ido e tu havias de ir também um dia destes ver aquilo com os teus olhos, enquanto o cheiro ainda se entranha na tua roupa, enquanto não tiram as carcaças dos carros da beira da estrada da Beira, enquanto a chuva não limpar os caminhos, havias de ir à noite, que é quando o fumo do que ainda arde se mistura com o nevoeiro, para te dar a ideia de como é conduzir sem ver, e tu podes ir devagar, eles não, tinham que andar depressa, e, chegando lá, já cá venho contar-te o que tens que fazer, não tenhas medo, as pessoas não mordem.
(podes sempre continuar a manifestar-te, é claro, aproveitas, tomas um café e compras um casaco dos bons, desses sem buraquinho)
Mas deu-se o caso de ter ido e tu havias de ir também um dia destes ver aquilo com os teus olhos, enquanto o cheiro ainda se entranha na tua roupa, enquanto não tiram as carcaças dos carros da beira da estrada da Beira, enquanto a chuva não limpar os caminhos, havias de ir à noite, que é quando o fumo do que ainda arde se mistura com o nevoeiro, para te dar a ideia de como é conduzir sem ver, e tu podes ir devagar, eles não, tinham que andar depressa, e, chegando lá, já cá venho contar-te o que tens que fazer, não tenhas medo, as pessoas não mordem.
(podes sempre continuar a manifestar-te, é claro, aproveitas, tomas um café e compras um casaco dos bons, desses sem buraquinho)
24 outubro 2017
16 outubro 2017
E tu?
Não há coisa mais deliciosamente potente que o deslumbre que sinto quando tenho diante de mim uma coisa realmente nova pela primeira vez.
(a viagem de avião para Dublin, a história do homem a quem parece que aconteceu não sei quê, La Fura dels Baus na Expo, o Sony CM-DX 1000, a televisão a cores na antiga FIL, o teleférico de Kandersteg, o beijo na gruta do Portinho da Arrábida, Saramago, a Borreguilles I, Live-Aid em directo, a bicicleta da Sobrinca sem rodinhas, o meu primeiro post que faz agora doze anos e me fez pensar nestas coisas)
(a viagem de avião para Dublin, a história do homem a quem parece que aconteceu não sei quê, La Fura dels Baus na Expo, o Sony CM-DX 1000, a televisão a cores na antiga FIL, o teleférico de Kandersteg, o beijo na gruta do Portinho da Arrábida, Saramago, a Borreguilles I, Live-Aid em directo, a bicicleta da Sobrinca sem rodinhas, o meu primeiro post que faz agora doze anos e me fez pensar nestas coisas)
15 outubro 2017
Ontem à noite
O tipo gritou lá do fundo do balcão do pub e quando eu olhei vi que o tipo era parecido com a voz que tinha, cabelo rapado e músculos de ginásio, não sei se é da minha imaginação, talvez seja, mas pareceu-me ver uma dessas tatuagens tribais que não querem dizer coisa nenhuma, a boca tinha aquela expressão do Chepe Santacruz sentado na cadeira do cabeleireiro a aviar os dominicanos.
Pediu um Bailey's.
12 outubro 2017
Anunciai a boa nova
De entre todos os meus rituais, uns mais excêntricos que outros, o que me vem de tempos mais recuados é a leitura de, pelo menos, um par de obras do Nobel da Literatura do ano, e com isto descobri Szymbrorska, Jelinek e Transtromer, para os esquecer quase de imediato, não precisei de reler Saramago nem Dario Fo nem Vargas Llosa, falhei Dylan propositadamente, que isto dos rituais sagrados também tem as suas excepções e, era isto que vos queria dizer, desde Pamuk não me deslumbrava tanto com um Nobel da Literatura como me está a deslumbrar este Ishiguro que estava a ganhar pó num canto escondido da minha estante, restando-me penitenciar-me pelo muito tempo que demorei a dar-lhe uma oportunidade.
11 outubro 2017
A problemática do lugar 3C
O lugar 3C é o pior dos lugares onde se pode viajar num voo de médio curso, ali estamos nós e os nossos raviolli de salmão selvagem com carpaccio de veado fumado, tudo acompanhado por um bom vinho tinto, depois de termos repetido o espumante servido à temperatura certa, e o passageiro do lugar 4D implorando em vão e pela terceira vez um copo de água sem gás, espreitando pela frincha da cortina que nos separa, a nós quase nos apetecendo estender-lhe discretamente o pãozinho de sementes de papoila que não nos faz falta, ele arregalando muito os olhos ao vislumbrar o nosso estalar de dedos, chamando a atenção da assistente de bordo para o facto de a quantidade de vinho tinto no nosso copo estar abaixo do aceitável, requerendo acção urgente ao nível de verter mais uns centilitros, o do lugar 4D simulando uma necessidade urgente de visitar os lavabos, nós pressentindo que a motivação é apenas aspirar o ar que se respira nas primeiras três filas, observar como nos assentam bem os guardanapos imaculadamente brancos, abotoados no primeiro botão da nossa camisa também branca, o nó de gravata aligeirado, enfim, uma maçada, uma verdadeira maçada viajar no lugar 3C.
Pipoco em modo catalão (II)
No entanto, com todo o sentido de responsabilidade, não desejando contribuir para uma rebelião na blogosfera com consequências imprevisíveis para o bem estar dos leitores em geral, a deliberação emanada do post anterior fica suspensa até que todas as Partes sejam ouvidas, avaliando-se os efeitos nefastos para a sociedade, medindo-se convenientemente o nível da depressão associada, aquilatando-se convenientemente e com sentido de estado a hecatombe generalizada que o fim de Pipoco Mais Salgado produziria numa sociedade que se pretende mais junta, mais solidária e mais progressiva.
10 outubro 2017
08 outubro 2017
07 outubro 2017
05 outubro 2017
Post bastante fofinho mas com final que nem por isso
Nestes dias de Lost in Funchal notei os simpáticos casais de idosos, eles de calção caqui e sandálias com meias, elas com óculos de sol fora de moda, cumprimentam-me no elevador com um sorridente g'morning, havemos de nos voltar a cruzar ao pequeno almoço, espanto-me sempre com as quantidades industriais de comida que transportam, sei que nos cruzaremos de novo na recepção, eles explicando detalhadamente à recepcionista o quanto estão a gostar da ilha, aproveitando para contar toda a sua vida enquanto eu aguardo com paciência e faço sinal à recepcionista do que pretendo e ela, continuando a falar com os simpáticos idosos , me estende um novo cartão que substitui o que perdi sei lá onde, piscando-me o olho, gosto de os ver assim, cúmplices, afinal é uma vida inteira juntos, amparando-se na velhice, ele trazendo-lhe mais um donut que ela, sentada, olhos azuis fixados no mar, agradece carinhosamente, enterneço-me com a gentileza com que se amparam a subir os poucos degraus, é delicioso vê-los tranquilos, envelhecendo juntos, partilhando os prazeres de uma velhice feliz e sossegada.
É uma pena que se empurrem de propósito nos caminhos das levadas, só para receberem o dinheiro do seguro de vida do parceiro...
É uma pena que se empurrem de propósito nos caminhos das levadas, só para receberem o dinheiro do seguro de vida do parceiro...
De como Pipoco junta os dois últimos posts e faz um post novo
A meditação faz-me aceitar o que não posso mudar e usufruir do momento, aceitar que uma estadia de pouco mais de seis horas na ilha se possa transformar numa estadia de cinco dias e quatro noites, aceitar que a bagagem de mão que era inicialmente um portátil e um livro inclua agora escova de dentes e roupa interior nova, mais duas camisas e um par de calças e uns ténis, tudo acondicionado numa mala novinha em folha, aceitar que as reuniões de Lisboa sejam agora sessões de trabalho com o mar em fundo, uma Coral na mão, os óculos de sol como melhores amigos, aceitar que a quarta-feira em Madrid seja afinal no Caniçal, aceitar que o Funchal está com sol e sem uma brisa e que no aeroporto, a menos de quinze quilómetros, o vento seja fortíssimo, aceitar que os aviões das low-cost aterrem e que levem os seus Clientes (parece que são passageiros, mas não, são Clientes) de barco para Porto Santo e os aviões da TAP sejam cancelados logo na origem (e sendo cancelados logo em Lisboa e no Porto não apanham as janelas de oportunidade no Funchal), é aceitar que o fim de semana prolongado em Londres seja afinal outra coisa qualquer, é aceitar que a Madeira nestes dias é uma espécie de Coreia do Norte, de onde não se sai nem se entra, é aceitar que não há Funchal-Faro ou Funchal-Porto ou Funchal-Manchester, ou Funchal-Sidney que me valha.
(filhos da puta, que servicinho de merda proporcionam aos Clientes, que desprezo pelas pessoas, esquecendo que estas pessoas pensarão dez vezes antes de voar de novo na TAP, que estas pessoas dirão a centenas de pessoas, potenciais visitantes da Madeira, que não venham, que escolham antes as Canárias ou outra coisa qualquer, que aqui nunca se sabe)
(filhos da puta, que servicinho de merda proporcionam aos Clientes, que desprezo pelas pessoas, esquecendo que estas pessoas pensarão dez vezes antes de voar de novo na TAP, que estas pessoas dirão a centenas de pessoas, potenciais visitantes da Madeira, que não venham, que escolham antes as Canárias ou outra coisa qualquer, que aqui nunca se sabe)
03 outubro 2017
02 outubro 2017
Mindfulness
Eu, Pipoco Mais Salgado, doze anos de prática de mindfulness, naquele tempo chamava-se "atenção plena", em verdade vos digo que a coisa não é mais do usufruir o que se está a fazer, aproveitar a boa comida sem a fotografar, ir a um concerto sem o gravar, jantar com amigos e não ter o telefone por perto, ir para casa sem pensar no mail que ainda vai chegar, tudo coisas simples, a coisa não é mais do que isto. E é tanto.
01 outubro 2017
Pipoco comenta as eleições (VII)
Jerónimo de Sousa diz que o povo que varreu o seu partido das Câmaras lhes vai sentir a falta. E acusou a rapaziada de terem muito simpáticos para ele, mas não votaram. Malandrecos.
Afinal o Robles está feliz. E com os dois botões da camisa desapertados.
O Valentim Loureiro acabou de vez.
O Rui Moreira fez um discurso de ressabiado. Quando se ganha não se pode ser ressabiado. Nem quando se perde.
O António Costa só falou de pois de acabar o jogo do Benfica. Está aborrecido.
A Ana Catarina Mendes não lê o Pipoco. Continua com o tal colar inenarrável.
Afinal o Robles está feliz. E com os dois botões da camisa desapertados.
O Valentim Loureiro acabou de vez.
O Rui Moreira fez um discurso de ressabiado. Quando se ganha não se pode ser ressabiado. Nem quando se perde.
O António Costa só falou de pois de acabar o jogo do Benfica. Está aborrecido.
A Ana Catarina Mendes não lê o Pipoco. Continua com o tal colar inenarrável.
Pipoco comenta as eleições (III)
As projecções indicam que, ainda assim, há oito por cento de lisboetas que votaram na Teresa Leal Coelho. Acho que nem a própria esperava tanto.
Pipoco comenta as eleições (I)
Está zero a zero com o Porto. E estamos a levar um banho de bola. Mais ou menos, claro.
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