23 junho 2019

Crónicas do Sul (II)

O dono do bar ofereceu-me camarão e sardinhas fritas, imperiais e aguardente de medronho, só porque eu lhe respondi que não se preocupasse quando ele me veio apresentar desculpas pela demora do serviço.

Fico tão diferente de férias, eu.

22 junho 2019

Notícias do Sul (I)

Todos os finais de junho, quando é chegado o dia mais longo, eu, os meus calções caqui, a minha camisa branca, os meus Stan Smith, os meus livros meio lidos e o meu carro alemão descemos a Sul, regressarei com barba de uma semana, a pele marcada pelo sal e pronto para os dois meses que me separam da viagem grande.

Nestes dias de Sul certifico-me que as melhores conquilhas são as do sítio que tem vai para um ror de anos as melhores conquilhas, que os ingleses continuam a apanhar monumentais escaldões ao fim do primeiro dia, que a melhor hora para ir à água é depois das oito da noite, que não há peixe fresco como umas boas sardinhas, que é imbatível o prazer de um bom livro depois de um mar bravo.

(talvez estes dias de Sul não sirvam para mais nada que não para me convencer que o bom velho mundo, no essencial, continua igual ao que sempre foi)

11 junho 2019

Narciso Rodriguez

O bom de herdar os livros de uma pessoa da nossa vida é que o cheiro da pessoa vem com os livros e fica ali a planar um par de semanas até que os livros, lentamente, se impregnam com o meu cheiro e acaba-se a espécie de magia.

10 junho 2019

Para não falar das poucas vergonhas com o Pedro...

O homem com cara de avô da Heidi que estava na mesa em frente à minha olhava-me fixamente com aquele olhar que só acontece quando se nos afigura que conhecemos alguém e não nos lembramos das circunstâncias em que a pessoa se cruzou na nossa vida, pareceu-me que pelo menos um par de vezes o homem com cara de avô da Heidi fez menção de se me dirigir, desistindo no último instante, talvez por causa da minha fraca empatia e da aura de indisponibilidade que trago por estes dias, o homem com cara de avô da Heidi não esmoreceu e quase me sorriu, acabámos por ir cada um de nós às nossas vidas, o homem com cara de avô da Heidi sem saber de onde me conheceria, eu estando absolutamente certo de que os homens com cara de avô da Heidi nunca me mereceram grande estima, aquelas situações que acontecem nos primeiros dias de Heidi nas montanhas sempre me deixaram inquieto.

09 junho 2019

Em verdade te digo, Ruben Patrick

Resumindo, Ruben Patrick, se algum dia alguém se dedicar a esmiuçar os meus dias para os resumir no epitáfio perfeito, há-de escrever "aquele que fugia das coisas que desejava assim que as conseguia".

02 junho 2019

Onde é que estávamos?

Aos poucos, muito devagar, em suaves prestações diárias, Paris começa a desapetecer-me, primeiro foram os cheiros, que apelavam ao melhor de nós e agora vão direitinhos ao cérebro, sobem-nos as defesas de agressivos que são, depois foram os meus olhos, antes mostravam-me uma cidade limpa, onde talvez me apetecesse viver um dia, nada destas temporadas de umas poucas semanas, agora há sítios que me doem de olhar. depois foram os museus, houve um tempo em que se encontrava paz em Orsay, nada de sermos empurrados por magotes de parolos de telefones ao alto, finalmente a comida, antes requintada e servida com tempo, agora servida a despachar e toda igual, acompanhada de maus Bordéus.

Tenho medo que um destes dia me desapeteça Lisboa.