26 setembro 2015

Palavra do Senhor

Fiquei um par de dias a pensar neste post da Palmier Encoberto, a mais profícua das coleccionadoras de metáforas nisto dos blogues. Veio-me à memória uma das minhas duas anedotas favoritas, a do tipo que matou o pai e a mãe e depois clamava por clemência no tribunal porque era órfão (a outra é a do tipo que tinha um mau emprego, os filhos eram uns imbecis e a mulher era demasiado próxima do seu melhor amigo, era um tipo sem prazeres nenhuns na vida que resolveu comprar uns sapatos medida trinta e oito, ele que calçava quarenta e dois, só para ter um prazer na vida: descalçar os sapatos quando chegasse a casa, mas essa história reservo-a para outra ocasião).

Só hoje, recostado na minha rede, vodka da marca do filme novo do Bond, James Bond, ao alcance da mão, depois de ler os jornais e de quase ter lido de um fôlego o Ensaio sobre a Cegueira, num dia que reservei para as minhas coisas, depois de duas semanas a tratar das situações de outros que não eu, me dedico ao tal post da Palmier, demasiado importante para não reflectir sobre o que lá está escrito, depois da camada de metáfora e retirando a camada da técnica escorreita. E, diz-me a Palmier e eu acredito, passámos a escrever sobre nada, só para que não nos aborrecessem e não nos expulsassem do clube, que nisto dos blogues há clubes, quem gosta da Pipoca mais Doce (que é uma espécie de Coligação PaF da blogosfera, ninguém aprecia o estilo nem o conteúdo mas ganha largueiro aos outros todos) não pode gostar da Ana de Amsterdam (uma artista das letras, dessas mulheres que desejamos estarem sempre mal de amores porque assim escrevem melhor), quem gosta da Pólo Norte (que agora tem uma espécie de mummy-blog para remediados) não apreciará a Mãe Preocupada (das poucas que me deixa sem palavras, embora seja só às vezes). Escrever sobre nada é uma arte, eu, que até sou dos que sabe alguma coisinha dos mistérios da vida, prefiro escrever sobre nada a maioria das vezes e aposto que não se nota muito. Mas, lá está, eu sou quem sou, sei bem que não se pode generalizar (e estas últimas duas linhas seriam aquelas que gerariam comentários muito sérios sobre a minha insensata gabarolice, não fosse ser sábado, as pessoas estarem a esmorecer com isto de os seus comentários não terem garantia de eternidade e eu não ter feito este parêntesis), e as outras pessoas dos blogues, com medo que lhes deturpem as palavras e arrisquem não ser consensuais acabam a postar coisas sobre a publicidade da Pipoca ou a escrever posts sobre o frio que está hoje (e mesmo assim a reescrevê-lo três vezes, não aconteça alguém achar que nem por isso, por acaso até está abafado, e a coisa ficar feia).

Escrever num blog é, tem que ser, um tremendo exercício de liberdade. Eu gosto da Cuca e da Domadora de Camaleões e do Lourenço e do Zé e da Susana e de quase todos os que tenho ali na minha lista. Mas há alturas que escrevem coisas tontas e eu lhes digo exactamente isso, que escreveram coisa tonta, o que é completamente diferente de eles serem tontos (acontece muito à Luna, por exemplo...). Não quero ir tomar café com eles e parece-me que também eles não querem ir tomar café comigo, embora sobre esta última parte não esteja tão certo, não devemos nada a ninguém, não temos contas a ajustar que não possam ser escritas num mail e resolvidas mano-a-mano, isto são só blogues, são mesmo só blogues.

E é isto. Não é?

20 comentários:

  1. Anónimo26.9.15

    Esqueceu-se de referir as velhas alianças que recomendou à Palmier desbaratar, por já não serem interessantes ou simpáticas, ou lá o que era.

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  2. Hesitei se comentava a parte do querer ou não tomar um café consigo, se a parte de isto serem só blogues.

    Decidi-me pela segunda. Com certeza que sim: isto são só blogues. Tal como os livros são só livros e a música é só música.

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    1. Fez a coisa certa, Susana.

      (um blog não tem a mesma importância que a boa música ou um bom livro)

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  3. Eu gosto de Dire Straits, de Rodrigo Leão e até de Maria Bethânia...gosto de estilos completamente diferentes, É por isso que gosto do Xilre, de Ana de Amsterdam e até do PMS.
    Hoje esteve um calor de ananases!!!
    Continuação de bom Sábado. ;)

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    1. :)
      "Não só", "Mas também".

      Até, muito! ATÉ já!!!...

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  4. Por mim falo, desinteressei-me muito e afastei-me quando começou a fazer-me mal, e enfim, se é para nos chatear, ao menos que se ganhe dinheiro com isso (acontece muito com a instituiçao emprego). E se antes havia uma série de "unwritten rules" pelas quais nos regíamos este pequeno mundinho, o que nos permitia manter a cordialidade e respeito mesmo quando não concordávamos, sei lá, por exemplo não fazendo posts insultuosos e a chamar nomes a outros bloggers, entrou-se numa nova era (curiosamente com alguma conivência da Palmier) em que nunca sabemos se de repente não somos alvo de agressões em forma de posts, e enfim, chinquilho para mim não.

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    1. Like neste comentário. Resmas de likes.
      E já não há pachorra para grandes tiradas filosóficas sobre a essência dos blogs, que isto são só blogs, e se quem cá anda a escrever tivesse talento a sério escrevia também noutros sítios melhores. Há uns que sim, e esses são os melhores. E há outros que não, e deviam. E depois há o pó, onde também me incluo, e não há pachorra para bolinhas de cotão a achar-se algodão.

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    2. Grande resposta, a da Luna (isto está moderado, não sei se o meu comentário vai aparecer debaixo do teu). Quanto a mim, tenho a dizer, outra vez, se isto fossem só blogs talvez não se lhes desse tanta importância. A questão é que isto são só blogs, é verdade, mas é aqui que muita gente passa muitas horas do seu dia, seja a pensar em posts, seja a ler posts, seja a escrevê-los ou a escarafunchar em caixas de comentários. Gostei muito da piada do senhor que matou os pais e depois se queixou que era órfão, o Pipoco também é um grande adepto das metáforas e de dizer as coisas pelas beiradas. Está aqui a Luna para pôr os pingos nos ii, aliás, como é costume. E isso é algo que já não se vê na blogosfera, o que é lamentável. Perde-se muito menos tempo. Mas isto da verdadeira coragem cordial não é para todos, nem todos se aguentam ao ónus. E eu pro nhénhénhé não tenho muita paciência. Tenho ideia que é um comportamento meio 15 anos, essa coisa dos clubezinhos e de só meia dúzia saberem do que estão a falar. Não há saco que aguente. Bjos e bom fim-de-semana

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    3. Luna, não concordo consigo. Que tem a conivência ou não conivência da Palmier a ver com a nova era a que se refere? Acho que a Palmier tem rasgos de genialidade, mas daí a ser a maestrina da blogosfera vai uma grande distância. Que responsabilidade tem ela relação ao que escrevem os outros bloggers? Ainda quanto à nova era, A Palmier mantém desde o início o mesmo registo. Já outros blogs, mudaram quase da noite para o dia.

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  5. Anónimo26.9.15

    Oi txio,

    Não reconheço gabarolice no ser quem é, pois a gabarolice é exactamente tentar ser quem não o é.

    Deixe lá isso dos Sábados e dos Domingos, um/uma comentador/a anónimo/a não eterniza nada. Vive o momento a cada post, um comentário de cada vez. A cordialidade é coisa ainda mais efémera nisto das internets.

    Saúde tio, seu pseudo-gabarolas (não é um insulto).

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  6. Curioso ver como, ao mesmo tempo que se apregoa a liberdade, se aproveita para dar um puxão nas correntes dos bastidores do blogomundo...

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    1. Anónimo26.9.15

      Nem mais, Charlie sim, mas só quando não me tocam a mim... cambada.

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  7. Claro que escrevo coisas tontas!! Pois se ninguém me parte o coração como raios posso manter a minha linha editorial histórica??

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  8. Num registo mais sério: não são apenas blogues. São janelas de comunicação com todos os riscos que isso implica. O risco óbvio é a sujeição à crítica por parte de pessoas que não têm qualquer obrigação de ser simpáticos connosco. São blogues, sem apenas. Mesmo que a crítica seja dirigida ao boneco e não ao autor, o boneco é filho do autor.

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    1. A ideia-chave é exactamente essa, Cuca: as pessoas não têm obrigação de ser simpáticas connosco. Têm, isso sim, o dever de ser cordiais.

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  9. Pergunto-lhe se já chegou a esta parte:
    "É desta massa que nós somos feitos: metade de indiferença, metade de ruindade."

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  10. Do seu post o que retive, com agrado, foi que tivesse lido de um fôlego o Ensaio sobre a Cegueira.

    Um bom domingo.

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  11. São mais que blogs. Muito mais. É o tal espaço de liberdade de que fala e esse é impagável.

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