Repara tu naquela mulher ali sentada, Ruben Patrick, essa mesmo, a que tem cara de Leonor Silveira no cartaz de Vale Abraão, vai no segundo café e tem o telefone em cima da mesa, a cada dez segundos verifica se chegou alguma mensagem, todo o interesse que ela tem, tem-no por estar a três mesas de distância, por não ter nome, podemos imaginar para ela todas as qualidades, que sabe Borges melhor que eu, que vive sozinha numas águas-furtadas em Alfama e não perde nenhuma mostra de cinema francês na Cinemateca, viesse ela pedir-me lume e acabar por se sentar, aproveitando o Saramago que carrego, desejando saber pormenores, por qual dos Saramago lhe recomendaria iniciar-se, num instante havia de se apresentar com um nome, talvez dissesse "Cátia, prazer", havia de dizer onde morava, havia de ser sítio onde as águas-furtadas não são mágicas, havia de começar as frases por "é assim" e, quando finalmente chegasse a mensagem esperada, notaria num relance que quem lhe escrevia se anunciava como "Môr".