16 janeiro 2015

Que faria eu, Lourenço, se fosse comigo?

Meu caro Loureço, faz bem em perguntar, embora a minha especialidade seja "senhora velhinha, com ar desorientado, dirige-se a mim em terminal de aeroporto", não é menos verdade que o quadro "mulher bem parecida, na casa dos trinta anos, aborda-me nos corredores de uma grande empresa, dois minutos antes de uma reunião" me é familiar, isto, é claro, sem a componente "a falar ao telefone", as mulheres desta tipologia, em me avistando, focam-se imediatamente, concedendo-me atenção indisputada, imagino eu que desligam abruptamente a chamada, simulando falta de rede (é comum as mulheres terem falta de rede), eventualmente justificando "Vou desligar, não vais acreditar mas o Engenheiro Pipoco está no meu campo de visão", deixando a interlocutora num misto de inveja e incredulidade.

Nestas ocasiões, meu caro Lourenço, é seguir o procedimento. Sendo mulher bem apessoada e na casa dos trinta (será sempre preferível que este "na casa dos trinta" signifique "no limite superior do conceito "casa dos trinta"") - espero que ninguém repare no conceito "dupla aspa final seguido de parêntesis) - conhecemos, de certeza absoluta. Se, pelo contrário, estivermos a falar de género masculino, mulher mal apessoada ou fora do limite vinte e nove a quarenta e um anos, o procedimento é claro e implica responder "desculpe, creio estar confundida, estou certo de não nos conhecermos", isto dito com sorriso amável mas firme, estugando o passo, prestando atenção à secretária de óculos de massa preta, rabo de cavalo e saia preta Versace, nos dá as últimas indicações sobre o personagem com quem vamos reunir.

A segunda parte do procedimento, havendo motivo de conversa (ou seja, cumprindo-se "mulher bem apessoada e na casa dos trinta"), é manifestar entusiasmo contido pelo encontro, escolhendo perguntas abertas que nos possam ajudar a reconhecer a pessoa (nos caso de a conhecermos efectivamente) ou de estabelecermos pontes (no caso de não a conhecermos de todo). Por exemplo "Como estão as coisas por lá?" pode dar-nos uma pista imediata e precisa ao que quer que seja "lá", estatisticamente ela responderá "lá no ginásio ou lá na "nome de empresa"?". "Como está o Zé?" (há sempre um Zé na história) pode indicar-nos que o Zé se revelou má gente e que o caminho está desimpedido, e assim sucessivamente.

Seja como for, não recomendo o procedimento de introduzir conversa, confiando no pressuposto de uma mulher se confundir e passar para ela o ónus de identificar de onde nos conhece a nós e, no entretanto, fascinar-se e acabar por nos conhecer mesmo. Não resulta. A sério. Não me pergunte como posso ser tão categórico, mas não resulta.

(diz-me o Ruben Patrick que uma célebre artista dizia "Nunca esqueço uma cara, principalmente se já me sentei em cima dela")

11 comentários:

  1. Cheios de sorte, que eu sou só um íman para maluquinhos.

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  2. O problema dos homens: acreditarem na aplicação de teoria complexa para o que pode ser simples.

    (é que dá tempo de crescerem um bocado as unhas à secretária dos óculos de massa, etc)

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    1. Anónimo16.1.15

      Concordo consigo, Susana. :)

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    2. Anónimo16.1.15

      Cuja saia Versace, por muito Versace que tenha sido, já está um trapinho de tanto uso. Há quanto tempo a gente já conhece essa saia e esses óculos ?

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  3. Anónimo16.1.15

    Ó Tio Eng, ou Eng. tio?, já aconteceu comigo virem ter comigo, meter conversa larga e eu não conseguir reconhecer...:( Ás tantas não aguentei e disse: "Não estou a associar ao projecto que lhe fizemos" (a julgar que era um cliente). E ele responder: Ó VW fomos colegas nas ESBAP, lembras-te? ... e eu fiquei tão mal...
    VW

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  4. Cláudia16.1.15

    Ah! então foi isso...
    Estava eu a falar "ao telefone", quando reparo num senhor que vinha lá na vida dele, mas que foi abrandando o passo, até ficar assim mais ou menos a um metro de mim, ficou ali parado a olhar para um lado e para o outro e a mexer em qualquer coisa e de vez em quando lançava-me assim um olhar fugidio, disse à pessoa com quem estava a falar, que já lhe ligava, porque estava ali um senhor que parecia querer dirigir-se a mim por algum motivo, não me lembrava dele, mas talvez me conhecesse ou quisesse alguma informação, desliguei o telefone e quase imediatamente a seguir, o senhor perguntou: então, há quanto tempo! como estão as coisas por lá?... desculpe, não estou a perceber, por lá onde?... por lá, com o Zé....o senhor deve estar a confundir-me com alguém, não sei de que Zé está a falar. Ele ficou muito atrapalhado, não me soube identificar a que Zé se referia, desejámos uma boa tarde um ao outro, eu retomei a chamada, ele seguiu lá para a vida dele.

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  5. Anónimo16.1.15

    eheheheheheh !!!! A Cláudia fez-me rir . É que aquela do "como estão as coisas por lá ? " e "como está o Zé ?" já me tinha posto a rir sozinha, pelo inesperado da tolice ( cuidado Lourenço ), mas agora interpretado por si, com o reconhecido humor que tem , foi mesmo um delírio.

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    1. Cláudia17.1.15

      Ainda bem que se riu Anónima. Pessoas simpáticas, que não têm problemas em elogiar os outros, merecem ter motivos para rir várias vezes ao dia.

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  6. ora, ora, "por lá" está sempre tudo bem.

    prudência Ruben. acautela a tua sobrevivência. não dês grande importância às suras do Tio Eng. os grandes profetas não deixam escritos.

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