Ontem fui correr à chuva. Calcei os meus ténis amarelos e fui correr à chuva. É uma das vantagens de se ser adulto, a minha mãe nunca me deixava correr à chuva. Claro que não disse à minha mãe que tinha corrido à chuva, não vale a pena preocuparmos as mães com coisas que sabemos que elas haviam de não gostar. Se a minha mãe soubesse, recomendaria prudência, basta que eu passe com o carro pelas poças de água e lá está ela a recomendar prudência, nunca se sabe se a poça é muito funda. Eu só passo com o carro pelas poças de água se não houver pessoas perto da poça. Nunca me preocupei muito com a profundidade da poça. Acho que as mães não gostam que andemos à chuva. Já com o meu pai, a coisa é diferente. Quando íamos à bola, às vezes chovia. O meu pai dizia que, se apanhava chuva quando ia trabalhar, podia muito bem apanhar chuva quando me levava à bola. Eu concordava, aquele era o tempo em que eu concordava com o meu pai, tal como este é o tempo em que eu concordo outra vez com o meu pai. Quando saíamos de Alvalade vínhamos molhados, no estádio antigo chovia em cima das pessoas. Podia-se levar chapéus de chuva, embora eu e o meu pai o deixássemos sempre no carro. Quando saíamos muito molhados demorávamos mais na roulotte das bifanas e ligávamos o ar quente, a chauffage, no máximo, para chegarmos a casa secos. A minha mãe fingia que acreditava que não nos tínhamos molhado e era por isso que nos dávamos bem.
Ontem a minha mãe ligou-me quando eu estava a sair do concerto de ano novo. Não me lembrei que estava a chover e atendi. As mães sabem sempre os dias em que apanhámos chuva.
Chauffage e não solvagem ou solfagem, como há tempos vi escrito por quem se acha a ultima batata do pacote. Aleluia! Um grande bem-haja pelo reforço, podia muito bem ter-se limitado a escrever que ligavam o ar quente.
ResponderEliminarAhahahahahahah
Eliminar(o Pipoco não faz ideia de quem fala o/a anónimo, pois não? Confesse lá...)
Ao menos levava um agasalho, ou saiu de corpinho bem feito?
ResponderEliminarÀ medida que o tempo passa, e por muito que tenha protestado e discordado dos pais em tempos idos, a concordância vai aumentando, aumentando...
ResponderEliminarNo meu caso, quem me queria proteger de todas as chuvadas, era a minha avó. O meu pai, por motivos de trabalho, tinha de viajar muito, e a minha mãe, sendo eu filha única, tinha muito receio que eu me tornasse numa dessas tontinhas mimadas que exigem que o mundo gire em torno delas e não aguentam nem uma queda, nem uma contrariedade. Como para o excesso de proteção já lá estava a avó, a minha mãe sabia que me tinha de preparar o melhor possível para o inevitável: Quem anda à chuva molha-se, mas viver, às vezes, também passa por andar à chuva.
ResponderEliminarHoje, já não tenho nem mãe nem avó, mas estou-lhes tão grata pela grande equipa que formaram, foram a dose certa entre o abrir a porta para apanhar chuva, e o estar lá com a mantinha e o chá quente para atenuar os efeitos da molha. E isto, fica-nos a valer para a vida inteira, mesmo para aquelas alturas na vida em que só lá estamos nós para ir buscar a mantinha e fazer o chá quente.
Diz-me agora o meu pai, muitas vezes, "Ainda bem que és assim como és, filha, ainda bem", e eu penso que isto é coisa de grande valor, mas, sim, dou o devido desconto, que isto as coisas são como são, e os pais, já se sabe, acham sempre que as filhas são uma grande coisa.
Boa noite, Pipoco.
Estou a gostar bastante de o "ler nesta versão" mais intimista.
ResponderEliminarMiss Avalon