Nestes dias felizes, desses poucos dias que, a par da semana de Dezembro, têm reserva de agenda garantida, dias em que sigo feliz de uma sala para outra, esquecendo-me do mundo, dias sem horas que não sejam as horas de começo dos concertos, fico mais tolerante, pouco me importam as tosses quando o violino toca em pianissimo, ganho tolerância adicional para quem fura as filas, não me aborreço com os aplausos a destempo, as crianças parecem-me sempre bem comportadas durante as peças, tudo me é agradável, as senhoras mais velhas carregadas de pós de arroz e cabelos louros armados, os cavalheiros com lenços a pender dos bolsos dos blasers, as famílias inteiras que estudam os programas e decidem em tempo real o que vão ver a seguir, os turistas que estavam ali só para ir aos pastéis de Belém e resolvem, também eles, entrar na festa.
Talvez seja a música o que acabará por nos salvar.
Dancem, dancem, ou estamos perdidos, dizia Pina.
ResponderEliminarAgora assim de repente, por falar em orquestra e salvação, lembrei-me do virtuoso violinista Wallace Hartley.
ResponderEliminarprefiro Szpilman, que se salvou tocando uma balada de Chopin...
EliminarE que belíssimo filme deu a sua história.
EliminarA única coisa que nos salva é o amor, meu querido.
ResponderEliminar«─ O que é exactamente a música? … Eu não o apreendo.
ResponderEliminar─ Qual a sua acção?
«Dizem que a música actua elevando a alma…Que falsidade!...Que estupidez!
─ A música actua de uma maneira terrível, eu falo por mim.
« ─ A música não eleva a alma. A música também não diminui a alma. A música exaspera-a. Nem sei como me hei-de explicar…
─ A música obriga a esquecermo-nos da nossa verdadeira personalidade, transporta-nos a um estado que não é nosso. Sob a influência da música temos a impressão de que sentimos o que não sentimos; que compreendemos o que na realidade não compreendemos; que podemos o que não podemos.
É como o bocejo ou o riso. Não temos sono mas bocejamos quando vimos alguém bocejar. Não temos vontade de rir, mas rimo-nos, ouvindo rir.
A música transporta-nos, de surpresa e imediatamente ao estado de alma em que se encontrava o artista no momento da criação, confundimos a nossa alma com a dele e passamos de um estado a outro sem saber porque o fazemos.
(A Sonata a Kreutzer)
Como é possível que simples feirantes toquem à noite, no piano, maravilhosamente bem Beethoven, para na manhã seguinte irem trabalhar normalmente, num ambiente onde se matam pessoas com toda a ligeireza?
( pergunta de G. Steiner)
https://www.youtube.com/watch?v=cdhBumzco8g
(ultima composição de Schubert, sabendo que morreria brevemente)
MH
Talvez seja!
ResponderEliminarSe a música é obra do diabo, e a música nos salva e também deus salva então a música é união divina entre os dois tidos como opostos? Se assim for, de que estamos propriamente a ser salvos?
ResponderEliminarTio, a música liberta-nos de nós mesmos ou agrilhoa-nos a extremos do nosso ser. Ser salvo é apenas viver.