A mesa foi o que sempre me fascinou no Natal. Mais que os presentes, muito mais que os presentes, o encarnado e o branco da toalha, os pratos de porcelana, os copos de cristal e o faqueiro brilhante e os guardanapos de linho imaculadamente branco era o que realmente me fazia aguardar ansiosamente o Natal.
Na mesa estavam as iguarias cozinhadas em casa, as massas dos sonhos cuidadosamente amassadas, o recheio do peru sabiamente temperado, o bacalhau, que tinha que ter aquela espessura e não outra, cozido em tempos diferentes dos legumes que o acompanhariam, tudo isto disposto na mesa de uma forma diferente dos outros dias. Era na mesa que estava a família vinda de longe, sempre com histórias diferentes para contar, mas sempre contando as histórias de sempre, as histórias que todos conhecíamos e de que todos nos ríamos como se fosse a primeira vez que nos eram contadas.
O meu pai escolhia os melhores vinhos para a ceia de Natal e os meus tios saboreavam reverencialmente cada néctar, olhos fechados, enquanto o meu pai esperava o veredicto final, sempre justo, nem sempre a merecer o seu acordo, que aquele vinho havia de ter sido servido depois do outro, que um blend com mais Touriga havia de resultar melhor. Mais tarde, muito mais tarde, o meu pai haveria de me pedir opinião sobre os vinhos a escolher para servir na ceia de Natal e eu haveria de aceitar a responsabilidade e os meus tios haveriam de ser tolerantes na crítica às minhas escolhas. No final, o café, uma mistura de arábica e robusta que se comprava numa casa de cafés da Rua Augusta, que tínhamos que esperar que assentasse no fundo do recipiente de vidro, o tempo suficiente para que o conhaque libertasse os primeiros vapores.
Este fascínio pela mesa, este respeito por escolher os melhores ingredientes, esta harmonia com a disposição da mesa, esta alegria por agradar àqueles de quem gostamos, esta maravilha que é termos os nossos perto de nós é verdadeiramente o que me continua a deliciar no Natal.
O Natal é sempre sentido, sempre diferente, e sempre tão igual. Os mais presentes, são sempre os ausentes, de quem falamos com carinho e alegria, por terem sido grandes adoradores do Natal e da família.Nada é diferente em relação aos preparativos e às decorações, nós é que vamos sendo cada vez menos em cada Natal que passa. Já fomos às dezenas, agora uma mesa chega. Só a saudade aumenta.
ResponderEliminarE quando se consegue alargar essas escolhas natalícias a outros momentos, a coisa não pode ser mais perfeita.
ResponderEliminarA ida à cave para a escolha do Porto que acompanha o queijo da Serra, o decantar do vinho e todas as histórias que se iniciam quando a garrafa de cristal entra na sala de jantar pela mão do pai ou de um dos tios é de tal modo mágico que chego a temer o Natal em que deixarei de sentir a ausência do tempo.
ResponderEliminarA calda de mel e vinho do Porto das rabanadas, o cheiro a canela da travessa da aletria e o acender das velas dão-me a certeza da história interminável que o ritual assegura.
Maria Helena
Comparando o teu post de mesa com o meu, dá-me ideia que as referências são ligeiramente diferentes. No entanto, brinde-se à diferença e à forma como seja a partir de que prisma for vista a coisa, família, mesa e Natal sejam conceitos que fazem sempre sentido juntos.
ResponderEliminarPipoco? Parágrafos?? :O.
ResponderEliminarO Natal a mim não me diz nada (os gatos não deixam, são testemunhas de Jeová) mas ainda bem que há quem lhe veja a magia e sentido. Variety is the spice of life, after all.
Just perfect!
ResponderEliminarCurioso - ou talvez não - como também é a mesa (com aquio que nela se serve e aqueles que à volta dela se sentam) aquilo que mais me fascina nos Natais. Muito mais do que os presentes.
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