30 abril 2012

(estava aqui à espera de um amigo para jantar e escrevi um post)

De todos os intrincados mistérios da natureza feminina, o mais mítico, isto assumindo que nunca teremos as capacidades cognitivas para entender na sua plenitude a razão porque vão elas aos pares ao toilette, o mais mítico, dizia eu, é aquele que elas designam como "jantar de mulheres", pronunciando a associação de palavras "jantar de mulheres" em voz baixa e reverencial, dando um cunho sagrado a esse momento épico.

Ora eu, do cimo da minha reconhecida experiência na temática, fruto do mais empírico conhecimento de causa, não porque alguma vez tenha sido convocado para tais tertúlias, mas porque se dá o caso de alguns destes momentos sagrados terem acontecido no meu espaço vital, quase sempre em momentos em que eu pretendia sossego para a minha leitura de Ulysses, isso sim, elevado à categoria de mito no que diz respeito à sua concretização e, mais ainda, elevado à categoria de utopia no que concerne a levar esta tarefa a bom porto, eu posso dizer em boa verdade que aquilo que elas designam como "jantar de mulheres" e que envolvem numa espécie de pacto de silêncio, não é mais que uma conjunto de indivíduos do género feminino, falando de forma descoordenada e com os decibéis directamente indexados aos jarros de sangria que o empregado de laço preto e bigodinho lhes vai servindo, quase sempre derramando a sangria porque se foca demasiado tempo na visualização introspectiva do conteúdo dos decotes, acabando por se desculpar com a fruta, o que não é absolutamente despropositado, atendendo ao contexto, uma profusão de saladas e sushi em cima da mesa, nada indiciando os bolos de bolacha e as mousses de maracujá que serão posteriormente servidos, tudo isto entrecortado pelo som de telemóveis que tocam dentro de malas, com músicas de Michael Bublé que não param de tocar enquanto elas remexem furiosamente nesse outro objecto digno de respeito que é uma mala de mulher, risos altos que acabam quase sempre com "esta gaja é tão maluca, pá...", tudo isto num claro desafio à minha capacidade de concentração e numa tentativa descarada de fazer com que eu termine o mais rapidamente possível o carpaccio de lagosta com redução de néctar do terroir Champagnois, o que invariavelmente acabam por conseguir, fazendo com que eu tenha que me movimentar no meio do caos, calando-se então por um momento, enquanto me dão a entender que talvez eu não devesse ter desapertado o terceiro botão da camisa branca, inqueitando-se com o suave vislumbre do meu sobretudo igual ao do Aznavour.

10 comentários:

  1. ai ai ai, revirar de olhos... :)

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  2. Sr.Pipoco ainda bem que o seu amigo se atrasou e pode escrever este post. Adorei e voltei a sorrir, com muita vontade.

    Eu também,diga-se de passagem, teria dado a entender que terceiro botão de camisa desapertado. Decididamente não.

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  3. Anónimo1.5.12

    Caríssimo

    A probabilidade de encontrar um restaurante que sirva, em simultâneo, "um carpaccio de lagosta com redução de néctar do terroir Champagnois" e um sushi regado a sangria finalizado com uma vulgar mousse de manga é igual à probabilidade que eu encontrar o George Clooney na Brandoa ( apenas porque eu não vou à Brandoa, claro).

    Tirando isso adoro os jantares de mulheres, com ou sem bolo de bolacha, com Bublé nos telemóveis ou no karaoke. Adoro sobretudo os jantares de mulheres longos, muito longos e que se prolongam pela madrugada. Até de manhã. Meio-dia do dia seguinte é perfeito.


    .......


    (Os homens, delas, ficam tão sozinhos)

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  4. Anónimo1.5.12

    A nossa natureza tem a arte combinatória imprescindível na descoberta dos rios da navegabilidade do grupo humano.
    Só o seu conhecimento excessivamente empírico o leva a pensar que quando jantamos bebemos sangria, comemos sushi e mousse de manga e posso assegurar-lhe que somos menos vulneráveis do que nos convém fazer acreditar porque a poesia é a nossa conta-corrente das obrigações que cansam e não inspiram. Mas é poesia na mesma.

    Maria Helena

    (acabe com esse gólgota do Ulysses e leia Retrato do artista quando jovem, caso contrário vai passar a abominar um tipo que não o merece ser, gaita!)

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  5. Ai, ai, que o Pipoco agora anda a flirtar com a misoginia!

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  6. E em que parte desde mundo é que se encontra um restaurante que sirva carpaccio de lagosta com redução de néctar do terroir Champagnois, sushi e bolo de bolacha?

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  7. AI AI, ESTE GAJO É TÃO MALUCO PAH!

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  8. Em verdade lhe digo, caro Pipoco, que não percebe nada de jantares de mulheres.

    (que é isso de sangria?)

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  9. Que restaurantes frequenta Pipoco? Já há uns tempos, uma vez a propósito da companhia feminina num jantar, e outra a propósito do dilema servir/comida fria, lhe deixei as sábias palavras da minha avó: filhinha, escolhe bem o que comes e onde comes. Depois de ler este seu texto reforço a minha convicção acerca da sapiência daquelas palavras, aplicáveis às mais diversas circunstâncias.Com esse cardápio e com frequência tão histeriónica, vê-se que anda a escolher mal o que come e onde come .

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  10. Anónimo4.7.12

    Eu queria saber o que pode ajudar uma abelha na vida única , de modo que é sobre ele que não poderia conceder uma resposta não verdadeira .

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