28 julho 2010

(Show must go on...)

Como certamente sabereis, todo o meu processo de crescimento se dá num contexto extremamente adverso, um contexto "Sporting não campeão", atentai, se em 1982 eu ainda frequentava o velhinho Estádio de Alvalade levado pela mão do meu pai, já em 2000 eu era pai de filhos, assim mesmo, no plural, enquanto os outros meninos adeptos de clubes com histórias menores conviviam alegremente no recreio às segundas feira e tinham fins-de-semana sadios e plenos de alegrias, como sejam o seu clube ganhar, já eu, pobre de mim, desde cedo me habituei ao facto de os meus fins-de-semana mais regulares no que concerne à alegria serem os que coincidiam com a época de defeso, sendo que me acometiam dores agudas ao nível muscular nos dias posteriores aos domingos, as segundas feiras, portanto, e nos dias posteriores às quartas-feiras europeias, as quintas-feiras, bem entendido.

É esta conjuntura adversa, toda a janela temporal que medeia entre o tempo em que ainda jogava o Manuel Fernandes e o Keita e aquele outro em que já se vislumbravam em campo o Peter Schmeichel e o Mário Jardel, reparai, se isto se pudesse contar como uma sequência de períodos da minha vida, assistiríamos ao episódio em que eu deixo de pagar meio bilhete no metropolitano, depois a sequência vertiginosa de amores de verão, sendo que nesse tempo os verões se estendiam por três longos meses, o tempo em que decido estudar elaboradíssimas matérias, que consistiam, entre outras coisas, na análise matemática, probabilidades e estatística ou mesmo termodinâmica, passando pelos episódios em que dominino toda a conjuntura de bares e discotecas na faixa delimitada a sul pela Seagull e a norte pelo Green Hill, a entrada no mercado do trabalho, os pés a pisar os solos de mais de uma trintena de países, distribuídos por sete consecutivos anos de mochila às costas e domínio perfeito das rotas dos comboios europeus, amigos que vão e outros que chegam, o tempo em que falava para casa utilizando credifone, depois bip, depois pesados telefones que careciam de uma mochila para os transportar, os números a iniciar-se por zero zero três seis, depois estes aparelhos de onde vos escrevo estas singelas linhas, todo este tempo num contexto "Sporting não-campeão", não percais de vista este contexto aziago, todo o tempo que separa a imperial dividida por três bocas e a garrafa de gin com o meu nome, nas principais casas da especialidade.

É neste cenário de dificuldades, quase vinte anos de carências várias ao nível da pertença, que se processa a minha maturação enquanto cidadão, todo um contexto de luta extrema contra as adversidades, carregando a cruz de ouvir as vozes do mundo a dizer "certo, ele é bastante capaz no que se refere às artes do amor, mas a verdade é que a equipa dele não é campeã vai para um ror de anos", a desvantagem arrasadora de "sim, ele é brilhante, mas tem aquela questão de a equipa dele não ser campeã" ou o mais demolidor "há qualquer coisa de errado nele, parecendo que não já nem me lembro qual foi a última vez que a equipa dele foi campeã".

(agora calhava bem um epílogo, uma conclusão, uma mensagem a retirar de tudo o que escrevi)

10 comentários:

  1. Vá lá é do Sporting, menos mal.

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  2. Só uma correcção (acho eu). Os números do antigamente não eram zero NOVE três seis?... A memória é curta, mas se não me falha...

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  3. Anónimo28.7.10

    Acredito que quem escre este blog seja uma pessoa interessantissima, mas o blog é tão maçador.

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  4. Confirmo, anónima. Ambas as suas crenças.

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  5. Bem vindo de volta.
    Em tempos idos ouvi uma história semelhante, de outro homem e outro clube. Acreditava veementemente que esse contexto aziago tinha sido determinante na formação do seu sólido carácter.
    Nesse mesmo ano, o SLB ganhou o campeonato e a mulher deixou-o. Parece que tinha razão.

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  6. Anónimo28.7.10

    1º de mãos dadas ao pai.
    depois de mãos dadas aos filhos.
    O próximo é só mesmo de mãos dadas aos netos...

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  7. E há que manter a tradição. Sendo do Sporting está visto que o processo de crescimento do Sr.Pipoco vai prosseguir da mesmíssima forma!
    Saudações Nortenhas...

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  8. Retive duas palavras deste post Peter e Schmeichel. No período aureo do gigante dinamarquês, quase me tornei adepta do Sporting. Ai Jesus!

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  9. Anónimo28.7.10

    Bons tempos, os do Seagull... Com ou sem vitórias do Sporting. Eu já fui tão feliz por esses lados...
    Sira

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  10. Sem esquecer o Jordão, o Barão e o Damas!!! Em 82 também eu ia a Alvalade p'la mão do meu pai.
    Do Seagull a Green Hilln... passando pelo Plateau, 2001, Jet Set (News), Van Gogo, Horta 2 e claro o inesquecível Summer Time!! Fechava sempre com a Ella. Ricos tempos esses.. em que tinha que trabalhar no Inverno para poder estoirar no verão!

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