O problema, Ruben Patrick, é que perdemos a capacidade de ser empáticos, de sermos capazes de um sacrifício por uma causa comum, hoje não teríamos ninguém para desembarcar na Normandia nem a combater por um valor mais alto, convidaram-nos a procurar a felicidade a toda a hora em vez do caminho duro e longo do mérito e confundimos tudo, pensando que isso de ser feliz é viver cada dia como se não houvesse amanhã, que todos os dias são dias de “experiências”, esquecemo-nos do nosso direito à tristeza e tratamos aqueles que ainda se lembram de como são os valores da solidariedade, os que não deixam os mais frágeis para trás, como imbecis que não sabem viver a vida, transformámo-nos em idiotas focados em nós mesmos, julgamos que tudo podemos e que nada nos abala, invencíveis e imortais, basta “sermos nós mesmos “, “pensar fora da caixa” e “sair da zona de conforto “.
Mas, Ruben Patrick, há alturas em sozinhos nada podemos, há ocasiões em que não temos outro remédio senão avançar juntos, em que só resultará estarmos todos do mesmo lado, pensando no que ganhamos todos e não no que vai perder cada um, em que não podemos fazer outra coisa que não seja preocupar-nos com o outro porque o outro somos nós.
Mas, Ruben Patrick, há alturas em sozinhos nada podemos, há ocasiões em que não temos outro remédio senão avançar juntos, em que só resultará estarmos todos do mesmo lado, pensando no que ganhamos todos e não no que vai perder cada um, em que não podemos fazer outra coisa que não seja preocupar-nos com o outro porque o outro somos nós.
"preocupar-nos com o outro porque o outro somos nós" é o exemplo de um conjunto de palavras que me faz vir aqui.
ResponderEliminarAliás é todo o post.
Muitos parabéns pelos 10 anos de blogue, Pipoco. E muito obrigada.
pois que sirva esta casa também para entreter os leitores :)
ResponderEliminar(é grande, mas andamos todos com muito tempo indoor, certo?)
RECLAMAÇÃO DIRIGIDA À
«COMPANHIA DAS ÁGUAS DE LISBOA»
Ilmo. e Exmo. Senhor Pinto Coelho, digno director da Companhia das Águas de Lisboa e digno membro do Partido Legitimista.
Dois factores igualmente importantes para mim me levam a dirigir a V. Ex.ª estas humildes regras: o primeiro a tomada de Cuenca e as últimas vitórias das forças carlistas sobre as tropas republicanas, em Espanha; o segundo é a falta de água na minha cozinha e no meu quarto de banho.
Abundaram os carlistas e escassearam as águas, eis uma coincidência histórica que deve comover duplamente uma alma sobre a qual pesa, como na de V. Ex.ª, a responsabilidade da canalização e a do direito divino.
Se eu tiver a fortuna de exacerbar até às lágrimas a justa comoção de V. Ex.ª , que eu interponha o meu contador, Exmo. Senhor, que eu o interponha nas relações da sensibilidade de V. Ex.ª com o mundo externo! E que essas lágrimas benditas, de industrial e de político, caiam na minha banheira!
E, pago este tributo aos nossos afectos, falemos um pouco, se V. Ex.ª o permite, dos nossos contratos. Em virtude de um escrito, devidamente firmado por V. Ex.ª e por mim, temos nós – um para com o outro – certo número de direitos e encargos.
Eu obriguei-me para com V. Ex.ª a pagar a despesa de uma encanação, o aluguer de um contador e o preço da água que consumisse. V. Ex.ª, pela sua parte, obrigou-se para comigo a fornecer-me a água do meu consumo. V. Ex.ª forneceria, eu pagava. Faltamos evidentemente à fé deste contrato: eu, se não pagar, V. Ex.ª, se não fornecer.
Se eu não pagar, V. Ex.ª faz isto: corta-me a canalização. Quando V. Ex.ª não fornecer, o que hei-de eu de fazer, Exmo. Senhor?
É evidente que, para que o nosso contrato não seja inteiramente leonino, eu preciso no caso análogo àquele em que V. Ex.ª me cortaria a mim a canalização, de cortar alguma coisa a V. Ex.ª... Oh! E hei-de cortar-lha!...
Eu não peço indemnização pela perda que estou sofrendo, eu não peço contas eu não peço explicações, eu chego a nem sequer pedir água! Não quero pôr a Companhia em dificuldades, não quero causar-lhe desgostos, nem prejuízos!
Quero apenas esta pequena desafronta, bem simples e bem razoável perante o direito e a justiça distributiva: quero cortar uma coisa a V. Ex.ª!
Rogo-lhe, Exmo. Senhor, a especial fineza de me dizer imediatamente, peremptoriamente, sem evasivas, nem tergiversações, qual é a coisa que, no mais santo uso do meu pleno direito, eu posso cortar a V. Ex.ª.
Tenho a honra de ser
De V. Ex.ª
Com muita consideração e com umas tesouras
José Maria Eça de Queirós
(roubado aqui https://conversamos.wordpress.com/2010/01/15/2-cartas-eca-de-queiroz-carta-a-companhia-das-aguas/)
Brilhante! Obrigada.
ResponderEliminarAcho graça e extremamente fófis a atitude daquelas pessoas que se não coíbem do belo do abraço em nome de valores como a amizade o amor ou lá que é. Desses amigos, mortos, também tenho eu muitos, mas se calhar era mais fófis estarem vivos.
ResponderEliminarJá agora, gostava ainda de deixar o meu, como direi?, beijinho?, aos apologéticos da "vida", aqueles que vão cá agora deixar de viver a bela vida, os passarinhos e isso, lá por causa de um fdp dum vírus armado em mete-medo. Lá ia agora deixar de ir arranjar as unhas ou gastar calorias no ginásio?!, era o que mais faltava!, queriam que me enfiasse em casa feito monja e que nem um cineminha pegasse?, uma vista de olhos rápida no shopping, que às tantas com esta "crise" até estão a fazer umas promoções jeitosinhas? OH, eu cá continuo a fazer a minha vida normal, pois.
ResponderEliminarEm tempos de um tipo de contágio que todos devemos evitar, muito obrigada por esta fonte de contágio bom que, para mim, é este blog:
ResponderEliminarPelas cócegas no cérebro, pela inspiração para ler, (por exemplo, agora, com isto do vírus, algumas coisas remeteram-me para "Ensaio sobre a cegueira", livro que tinha mesmo de ler), para ver, para ir, pela inspiração para testar as potencialidades do que temos ao nosso alcance, e, se possível, pormos o nosso cunho pessoal, único, que o que temos em mãos pode não ser, à partida, grande coisa, mas que a excelência está na forma como trabalhamos esse ponto de partida, no cuidado que lhe dedicamos, por todas as vezes em que aqui venho descontrair das exigências da vida a acontecer, principalmente, quando tenho de pensar em coisas mais difíceis e arranjar soluções para elas, por todas as vezes que me desmanchei a rir com a forma como analisa várias situações do calibre "A Anita não é bonita mas acredita que a noite cai".
Em tempos de tanto ponto com nó, muito obrigada por este ponto sem nó.
Tivéssemos também num tempo de abraços possíveis, que não estamos, (para além de dar já ali um à kina), agora, seria a parte em que daria um valente abraço, mas a quem? Sim, a quem? A Pipoco Mais Salgado que, não tivesse eu, há pouco tempo, visto "O caso Thomas Crown", continuaria a ser, para mim, um zero zero sete, mas sem estar ao serviço de Sua Majestade e agora é Thomas Crown? Seria o abraço para o simpático rapazola que alerta o tio para todo um outro tipo de problemáticas, Ruben Patrick, de seu nome? Não, desta vez, o meu abraço inteiro, e tirando as partes, digamos assim, excessivamente exageradas do filme, seria para a representação de um alguém que, na minha maneira de ver as coisas, estará mais perto da essência do Autor deste blog, Jean Etienne Fougerolle, personagem de "De braços abertos". Portanto, o meu abraço inteiro, seria para o Autor, quer corresponda, ou não, à representação que dele tenho.
Pela parte que me toca, muito, muito obrigada, por este blog que hoje faz dez anos.
Ai, senhores, senhores, "Tivéssemos também num tempo...", é "Estivéssemos", claro. E, para a Kina, o abraço também não é assim à maluca de "dar já ali", também é com o condicional, daria se estivéssemos num tempo de abraços possíveis.
EliminarPronto, agora sim. E muito boa noite, Autor desta situação internética.
Então, meu caro?!
ResponderEliminarAs atitudes mencionadas no primeiro parágrafo radicam na obsessão da legião de imbecis que passa oito horas diárias de despersonalizaçăo nas redes sociais, para depois organizar a *Festa do Corona*(?).
O segundo parágrafo poderia ser, na apologia da inexistência de liderança neste país da treta, na perpétua cobardia política, facilmente proferido pelo Costa, pelo Marcelo, pela Graça da DGS ou pela Temido. Agora a responsabilidade é de todos. Pois é! Com gente daquele calibre quem nos salvará? E vamos todos juntos, mãos dadas, tossindo uns sobre os outros, ultrapassar mais um desafio à nossa existência.