17 março 2019

Abrindo o capítulo de Paris

O Fouquet's não era, de todo, o meu restaurante favorito em Paris, podendo escolher, prefiro o Café de la Paix ou o Chez Julien, isto para não citar aqui o incitável Au Pied de Cochon, essa casa de desgraça que jamais admitirei ser um dos meus altares da cozinha quando tenho que fazer em Paris, mas caramba, quando os Coletes resolvem destruir um dos mais bonitos restaurantes da segunda cidade mais bonita do mundo, como poderemos continuar a apoiar a sua causa, seja lá ela qual for?

16 março 2019

Fechando o capítulo da Índia

Muitos dias depois de regressar, eu que sempre soube que as coisas são como são, desconfio das memórias e questiono se foi como as recordo que as coisas se terão realmente passado, Forster escrevia que "nada na Índia é identificável, e o simples facto de querer identificar alguma coisa provoca o seu desaparecimento ou a sua transformação em algo diferente", é precisamente assim, talvez o colchão do ashram não fosse tão duro, talvez o perfume do incenso na cerimónia do Aarti não fosse assim tão intenso, talvez a estremecimento ao tocar as águas do Ganges não fosse assim tão forte, talvez o deslumbre de caminhar nos Himalaias não fosse assim tão mágico, talvez o frio em Leh não fosse assim tanto, talvez a comida não fosse assim tão picante, talvez as pessoas no comboio não fossem assim tantas, talvez.

14 março 2019

Depois da Índia

Depois da Índia quis tomar café, sei de um lugar onde o processo é perfeito, os grãos foram cuidadosamente escolhidos por mãos sábias, a torra foi feita com a tranquilidade dos que sabem esperar, a água tem a mineralização perfeita e a pressão da máquina foi regulada por quem sabe do assunto. A chávena era das que não tira perfeição ao momento e o silêncio do homem que tira o café estava alinhado com o momento sagrado que é aquele em que as primeiras gotas começam a cair, primeiro um pequeno fio da poção mágica, libertando os primeiros odores, depois uma porção mais generosa que só se interrompe com o último toque de arte, quando o homem que comanda a máquina interrompe o fluxo, de forma a que a chávena contenha a quantidade exacta, nem uma gota a mais nem a uma gota a menos. Finalmente o homem da máquina estende-me a chávena, uma espécie de ritual sagrado, ambos respeitamos a solenidade do momento, o homem sabendo que me entrega uma preciosidade, eu em silêncio, agradecendo com um ligeiro aceno, finalmente o momento de aspirar o aroma, em atenção plena, antes de chegar a chávena aos lábios, sentindo o aveludado da espuma cimeira, a temperatura certa, só eu e o meu café, reencontrados depois de um mês de espera, um momento de prazer absoluto e magnífico, tudo isto por sessenta e cinco cêntimos de euro.