Por razões que desconheço, há muitos anos me reconhecem habilidade para escolher vinhos, não importa a mesa que for, os novos entrantes nas tertúlias habituam-se desde a primeira vez que quem escolhe o vinho é o Pipoco, havendo sempre quem recorde pomadas lendárias que este que vos escreve escolheu, basta essa invocação para que se perpetue a regra sagrada e controle os ímpetos dos que chegam, desmoralizando-os de mostrarem os seus saberes ou de se candidatarem a macho-alfa dos jantares, amaciando-lhes os níveis de testosterona e mantendo a tradição de as coisas serem como são, soubessem eles que me limito a encenar o momento, colocando com vagar os meus óculos de ver ao perto, os de aros redondos, demorando-me na escolha, hesitando, perguntando ao empregado por vinhos que já sei que não estão na carta, questionando se não terão por acaso a colheita de um ano que sei estar esgotado, escolhendo finalmente, a multidão silenciosa, aguardando o veredicto, enquanto o empregado vai e vem eu anuncio o que nos espera, usando com saber mas aleatoriamente as palavras "final de boca a morango" se for tinto ou "cítrico" se for branco, demorando-me na influência que cada casta tem no blend, anunciando o tipo de madeira em que o vinho foi guardado, finalmente a chegada do vinho, a demora na prova, duas ou três notas segredadas com ar severo ao empregado, aconselhar que deixem o vinho respirar dois ou três minutos para que liberte os vapores certos, explicar que aquela acidez é por ser um vinho de vinhas velhas, todos assentindo que sim, que se nota perfeitamente, garantindo que ainda não é desta vez que dirão de Pipoco que ele não é grande coisa a escolher vinho.
Ah, a encenação perante uma carta de vinhos resulta na perfeição! Assim haja uma bela refeição a acompanhar...
ResponderEliminarBoas degustações, Pipoco. ☺
Terça, às vinte e uma e trinta e nove (com um camadão de nervos enquanto visiono o meu Benfica...)
ResponderEliminarUma das coisas que aprendi com isto de viver, a segurança que transmitimos, faz mesmo toda a diferença, é fundamental para que as pessoas adiram.
Agora, normalmente, a segurança tem por base, pelo menos, algum conhecimento sobre determinada coisa. Sem saber nada sobre um assunto, não produziria o mesmo efeito, pois não, Pipoco? Está até a fazer-me lembrar aquilo que se diz da sorte "dá muito trabalho".
E a pessoa poderá ser assim tal como o Pipoco, por exemplo, e ainda se divertirá à brava a engendrar toda uma encenação (ar sério e conhecedor por fora, perdido de riso por dentro?)
E, lá está, joga também a favor da pessoa mais segura a insegurança alheia no que toca aos conhecimentos na matéria e o facto de ninguém querer ficar mal visto.
Poderá ainda dar-se o caso de aparecer gente mais conhecedora, mas, se, para além disso, for também gente "que sim senhores!" apenas assistirá tornando-se "divertidamente" cúmplice. Mais tarde, poderão trocar ideias com o "Encenador", que ficará mesmo grato com o contributo para o aumento do seu conhecimento. É assim, Pipoco?
Boa noite! (vou enervar-me mais uns minutos...)
Nunca ouvi falar do final de boca a morango e olhe que ... O Sr. Pipoco é uma fraude. ;)
ResponderEliminarBons jantares!