... o que acontece quase sempre, proporciono a mim próprio uma dezena de minutos de contemplação dos vídeos de touradas à corda, a coisa passa em contínuo na montra da loja de jornais já fechada do terminal de saídas, uma generosa oferta da Foto Gabriel, Açores, há homens com guarda-chuva que espicaçam os touros bravos, os homens invariavelmente carregam uma super-bock na mão e óculos espelhados na cabeça e são demasiado lentos na hora de escapar do touro, alguns tropeçam em si próprios na hora de escapar, a vida tal como ela é, a história acaba sempre com o touro a aborrecer-se com a provocação, o homem esvoaça no ar, a garrafa de mini cai em câmara lenta na calçada, a espuma a perder-se pelo gargalo, o homem a tentar proteger-se da fera, os homens da corda a salvar a situação, o homem a acabar por se levantar a custo, cambaleante, atarantado, os amigos a incentivá-lo a voltar à carga, o homem a não ter outra opção que não voltar, amarrotado, sem a sua mini super-bock, os óculos espelhados perdidos algures, a camisa em farrapos, o homem a cambalear, braços levantados, ar de quem não quer estar ali, eu a pensar que, não houvesse mulheres a ver, e eles renunciariam a nova investida.
Entretenimento boçal de um povo imbecil.
ResponderEliminarsão os perfeitos selvagens
ResponderEliminarvw
É, não é? Muitas vezes escolhem a forma completamente errada de se "armarem em engraçados" e tendem a desgraçar-se particularmente, são capazes de fazer as coisas mais estúpidas, quando pensam poder estar em causa a máxima "Eu sou muito homem". O meio em que vivem, o contexto no qual foram criados, é determinante para essa definição, mais a educação que tiveram a sorte de ter ou o azar de não ter. E, sim, é verdade que se estiverem mulheres por perto, se estiver então uma mulher que interesse particularmente por perto, a coisa pode tomar proporções de desgraça completa, mas a pressão dos outros homens também conta bastante, não conta? Não vão dar agora aos outros trunfos para que possam pôr em causa a sua valentia enquanto machos.
ResponderEliminarSabe, desde muito miúda que isso me faz, a palavra certa é mesmo pena, essa pressão que muitos sofrem, desde crianças, para que sejam homens no que isso tem de mais palerma. Pensei sempre como deveria ser horrível para o puto pacato que prefere ler e que leva dos outros por não gostar de jogar à bola nem de andar à porrada, o puto que preferia estar a beber um refrigerante mas "tem de" beber álcool até cair que, lá está, isso é que é de homem, o puto que ainda não teve a sua primeira vez na idade que os outros consideram que "É de homem" e que é atazanado com isso, o puto que ensinaram aos dois anos que era de homem, que tinha muita graça, andar a levantar as saias das meninas (sim, também assisti a isto) e que hoje é muito bem capaz de andar a levar bofetões, mesmo que só metafóricos, sem saber de que terra é mais "o seu machismo", e esse homem da sua história, que também voltou sem querer estar ali, mas, tudo indica, no contexto no qual está inserido, não haveria alternativa para ele, é que não seria de homem se não voltasse...
Excelente análise, Cláudia Filipa.
EliminarAssino por baixo.
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Maria
Sabe uma coisa, Maria, dos comentários que tenho feito em modo conversa totalmente séria, este foi um dos que mais gostei de ter deixado aqui escrito, tenho a certeza de que entenderá a razão.
EliminarEste post, para mim, post fantástico à Pipoco, "que está mesmo a pedi-las", deu-me a oportunidade. Está lá tudo, foi só pegar.
Olá Claudia, pois eu gostei mesmo de ler o que escreveu, tal e qual o que eu penso sobre o assunto de ser ou não ser homem.
EliminarEstive nos Açores há trinta e muitos anos (quando ninguém ia aos Açores) e assisti a uma dessas touradas à corda em Porto Judeu (não por opção, ia num tour à volta da ilha e o motorista parou e disse: e agora vamos assistir a uma tourada à corda. E eu e uma amiga (as únicas jovens do grupo): omg! e agora o que fazemos? Vários braços nos ajudaram a subir para um muro, e dali vimos chegar a fera, que até era pequenita, e o que vi foi uma espécie de brincadeira entre o tourito e os homens, com o animal a dar umas marradas, alguns homens com chapéus abertos para se defenderem (não recordo bjecas nem óculos espelhados, mas pode ter havido), ninguém espetou nada no animal, não houve feridos e pareciam todos muito divertidos.
O avião não atrasou e não havia vídeos nessa altura. Talvez agora filmem umas touradas mais "Typical" para chamar turistas, não sei. Os Açores estão menos genuínos, mais sofisticados, talvez eu tenha assistido a uma tourada mais genuína.
Das 4 ilhas que visitei (Terceira, Faial, Pico e São Miguel) recordo pessoas simples, simpáticas e acolhedoras e paisagens absolutamente deslumbrantes, inesquecíveis, ilhas maravilhosas aonde gostaria de poder voltar.
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...e o que acontece aos guarda-chuvas com que os homens, de mini na mão, espicaçam os touros bravos?...Resposta que eu gostaria de ouvir: também voaram, e, quais boomerangs, tomaram o caminho de regresso, ficando-lhes espetado naquele orifício abaixo da espinha dorsal...
ResponderEliminarEu penso que o mundo - nesse aspeto de "homem que é homem mete-se à frente do touro", etc - está em ordem. Porque as mulheres que lá estiverem para ver tal "ato de coragem" são as que agradam a esses toureiros.
ResponderEliminarAs que não estiverem lá porque outros valores as chamam também não agradariam aos tais toureiros.
Quem é que dizia que as coisas são como têm de ser? Ou era as coisas são como são?
É tão comovente as ladies amiguinhas dos animais.
ResponderEliminarNão se pode fazer doi doi ao bichinho que é muito desportegido o pobrezinho.
Aos bichinhos "desportegidos" que são aqueles que o caríssimo dear quereria ter dito praticam desporto, a esses não me incomoda muito fazer-lhes dói dói porque presumo que se refere aos de duas patas.
EliminarAos outros não. Adoro-os a todos do coração. No seu habitat, em casa e no prato.
adorei o comentário, era o que faltava para conferir genuinidade a esta dialéctica da caixa de comentários: faltava o toureiro estronço, a querer partilhar o seu ponto de vista. mas, coitado, neste habitat aqui, quem está desportegido é ele próprio...
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