03 outubro 2012

Pipoco ensina-o a ser uma sumidade na escolha de vinhos

O primeiro passo do processo é não aceitar a sugestão do empregado de mesa, convirá decliná-la com elegância, questionando-o sobre a origem do "vinho da casa" e, admitindo que o empregado nos sabe elucidar, fazer um ar agastado à menção de ser um vinho particular de um senhor ali da zona de Pegões, recusando ainda as propostas que o empregado nos fará, primeiro um Esteva, depois um Marquês de Borba, para terminar num Monte Velho. Fazer um gesto de recusa enérgico com a mão, mostrar uma cara agastada e solicitar enfaticamente "traga-me a carta de vinhos por favor".

Com a carta de vinhos na mão, estudá-la aparentando um ar entendido, com uma eventual menção à maçada que é a carta incluir Ermelinda de Freitas Reserva, mas do ano de 2005, se fosse do ano de 2008 a coisa seria mais composta, mas o ano de 2005 não foi fantástico para a casa. Sugerir aos comensais um monocasta Syrah, isto admitindo que todos alinharão nas tirinhas de porco preto, que, toda a gente sabe, é o que melhor vai com um monocasta Syrah, o que será imediatamente aceite, de igual forma seria aceite uma mistura de Touriga Nacional e Malvasia, afinal o entendido é você e só o facto de ter recusado à partida um vinho sugerido pelo empregado e saber que a monocasta Syrah acompanha bem com as tirinhas de porco preto que todos irão escolher, mesmo que alguns se inclinassem para os filetes de pescada ou para o cozido à portuguesa, afinal você acabou de os convencer que as tirinhas de porco preto é que é, combinam tão bem com o tal monocasta Syrah, foi você quem disse.

Na hora de provar o vinho, rode o copo e diga alguma coisa sobre a lágrima. Prove o vinho levando-o levemente aos lábios e aparente um semblante carregado, impenetrável, deixando a mesa em suspenso sobre o seu veredicto final. Antes de emitir opinião, pergunte ao empregado se o vinho estava guardado na posição vertical ou horizontal e diga "hummm..." qualquer que seja a resposta. Informe finalmente que o vinho está bom, pode servir, mas aconselhe os comensais que devem deixar respirar o vinho um par de minutos no copo, de forma a libertar os taninos e equilibrar a temperatura com a temperatura ambiente. Isto não serve rigorosamente para nada mas dará credibilidade aos seus saberes. Quando passarem dois minutos, autorize então que o vinho seja bebido, não sem antes dar um último conselho, que os comensais preparem o palato degustando uma pequena porção de pão alentejano com queijo de Azeitão, que é o que vai bem antes de um monocasta Syrah e é o grande segredo para que o palato esteja finalmente preparado para as tirinhas de porco preto. Delicie-se com as caras de respeito e reverência pela sua doutrina e decida que amanhã será dia de aconselhar um Cabernet Sauvignon a acompanhar trouxas de ovos.

Recoste-se e sorria , brindando à longa vida dos presentes. Tão fácil, não é?...

14 comentários:

  1. Pipoco, meu caro Pipoco, mas alguém o leva a sério?
    Só aqui entre nós, impressionará mais se se atrever a fazer uma demonstração do PAE do vinho. Os anos são muito fáceis de escolher, basta que sejam de calor para que o vinho seja bom. Mesmo que não perceba nada de castas, se escolher um cabernet sauvignon não errará. Se optar por um branco, o chardonnay não desilude. Fácil, não é? E eu nem percebo nada de vinhos (pelo meio poderá falar das temperaturas, dos taninos, lágrimas e afins, haverá sempre alguém mais crédulo).

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    1. Stiletto, nem sempre um ano de calor no Verão significa uma boa colheita. Saberá que basta uma vindima com humidades relativas acima dos pontos de orvalho para deitar tudo a perder, para além de o tempo quente não ser aconselhável depois da terceira semana de Agosto de anos bissextos.

      (e o Cabernet Sauvignon não vai bem com carnes vermelhas temperadas com massa de alho, o que deita por terra a sua argumantação)

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    2. Anónimo3.10.12

      Adorável.
      Stiletto, desde talhas com água,a monocastas o que importa é o estar na boda, na festa, na comunhão. De qualquer modo, diria que os ensinamentos do Senhor Salgado são importantes para uma introdução apropriada para ao essencial.
      "Não importa o que sabes, mas o que saboreias", dizia o nascido no país basco.
      Também gosto muito de a (re)ler.

      Maria Helena

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    3. Ah!Ah!Ah! Pipoco, o meu caro é verdadeiramente adorável, nunca se fica, pois não? Sabe muito bem que me limitei a debitar uma generalidade, isto já bastará para um leigo se "safar" na maioria das vezes, quiçá até impressionando por se lembrar que 2005 foi um ano excepcionalmente quente.
      (e o cabernet sauvignon, vai bem com tudo, permita-me a ousadia da discordância)

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  2. Anónimo3.10.12

    Asim de repente isto fez-me lembrar um daqueles discursos do Gasparzinho...

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  3. Esta metéria é caso para mestrado. Nem a licenciatura chega lá.
    Muita informação.
    Fico-me pelo da casa. Só quero desfrutar duma refeição agradável...sem complicações.

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  4. O que eu gostei das trouxas de ovos e cabernet sauvignon... Que requinte! Só para grandes apreciadores.
    Marta

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  5. Eu sou uma pária nesta matéria ! Cometo diariamente o sacrilégio de não beber vinho... por muito incrível que possa parecer, não gosto de vinho...

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  6. E só agora me dei conta que fala ali em malvasia, essa casta não é usada para se fazer o vinho da Madeira?

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  7. Quase que aconselhavas um Valle Pradinhos directamente. Mas deixa-me que te diga, um Touriga Nacional com Malvasia não me parece que seja grande combinação. Ora chuta aí um exemplo, fachavor.

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    1. O malvasia é usado para vinhos doces, estou em crer que o "nosso" Pipoco está a rir à gargalhada, enquanto nós dizemos asneiras sobre o néctar de Baco.
      E já que estamos em maré de dizer asneiras, também não sei se o cabernet sauvignon será o ideal para acompanhar trouxas de ovos, são demasiado doces e irão acentuar-lhe os taninos, eu escolheria um merlot.
      (e as saudades que tinha disto?)

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    2. Stiletto, quando combinado com outras castas, o malvasia dá um bom vinho branco de mesa. Mas ainda estou à espera da dica do Pipoco.

      PS - Ele estará mais a sorrir do que a rir ;)

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  8. Não serve um bag-in-box, servido no jarro? Damn it!

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  9. *tolan tira notas mentais*

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